É muito comum que o sonho de uma brasileira ou de um brasileiro de classe média seja se graduar, constituir uma família e adquirir bens materiais como automóveis e casa própria.

As construtoras, muito espertas, aproveitam em suas propagandas para colocarem-se como aptas a realizar uma parte desse sonho: oferecem apartamentos em prédios luxuosos, com uma enorme área de lazer, piscina, sauna, academia, espaço gourmet, mini mercados no interior do condomínio e infinidades de outras coisas que raramente serão utilizadas pelos futuros moradores. Tudo isso com a possibilidade de realizar um bom financiamento ou pagar um preço melhor se o apartamento for comprado na planta.

É interessante notar que muitos desses condomínios estão localizados ainda próximos das grandes cidades e que também estão extremamente verticalizados: os prédios de cada bloco possuem para mais de 20 andares. É nesse tipo que focarei minha análise, mas ela também seria válida para os condomínios mais distantes dos centros da cidade, com casas em vez de prédios.

As pessoas que pensam em adquirir esse tipo de moradia irão utilizar o mínimo possível o espaço público, já que todas as necessidades básicas e de lazer são providas no interior dos condomínios. A ideia de isolamento das ruas e tudo que nela acontece ressalta o desinteresse em relação ao que é público e também ao que é diferente, que não raro é visto com a partir de preconceitos.

É no centro da cidade e nos espaços públicos em geral que acontece a socialização. Mas é lá também que ocorrem assaltos; é onde se vê descuido e sujeira; é onde se encontra o outro diferente daquilo que estamos acostumados, quando se permanece apenas num mundinho próprio.

Essas pessoas, ao se isolarem dessa forma, convivem apenas com seus semelhantes e aí é ainda mais difícil querer uma empatia delas em relação aos problemas do mundo, que acometem aqueles que não estão atrás das grandes portarias de vidro e das câmaras de segurança.

Aqui em Belo Horizonte, uma cidade cada vez mais vertical e cinza, os condomínios desse tipo estão fazendo um enorme sucesso. E não é de se estranhar que foram deles que partiram aqueles “buzinaços” feitos quando a presidenta, de um partido de centro-esquerda discursava na mídia golpista.

Sem querer generalizar, porque isso é errado mesmo, mas é importante não desconsiderar algumas coincidências... De tanto me questionar e usar sempre a minha empatia, consigo até compreender o porquê de tamanho reacionarismo nessas pessoas… o que é diferente de aceitar o que ocorre, já que compactuo de ideias completamente opostas. 

Quando uma pessoa se depara, no seu dia-a-dia e em suas horas de lazer apenas com pessoas parecidas consigo, tanto no quesito financeiro, como fisicamente ou mesmo na história de vida; quando as pessoas negras que encontram são, em sua maioria os serviçais, como o porteiro, o jardineiro, a empregada doméstica ou a babá (de branco, óbvio); quando a rua é demonizada, o diferente é temido e a preocupação com a segurança chega a níveis até insanos; quando os meios de informações pelos quais se utilizam reforçam tudo isso… É fácil mesmo apoiar um golpe de estado, ridicularizar políticas afirmativas, achar que homens e mulheres cumprem “papéis definidos” na sociedade ou que o racismo branco, de fato, existe.

Não é pretensão minha fazer uma associação direta entre a pessoa ser reacionária e morar em condomínios. Apenas percebi, aqui em BH, uma coincidência não tão coincidência assim, pois o custo para se ter acesso a esse tipo de moradia é altíssimo, e geralmente pessoas com maior poder aquisitivo, no nosso país, têm a tendência a assumir esse tipo de posição política.

O que mais me preocupa, no entanto, são as próximas gerações que nascem e crescem em lugares isolados da sociedade. A tendência em permanecer nesse isolamento e não compreender as mazelas da sociedade que não os comete é altíssima. Mesmo a utilização de espaços públicos, como ir à escola ou à universidade é feita de modo apartado, com a utilização de carros ou motoristas particulares no percurso, raramente o transporte público, por exemplo.

Estamos vivendo um momento político e social em que aqueles que compactuam com os valores conservadores e extremamente conservadores parecem temer qualquer avanço que nossa sociedade possa ter feito ou que viria a fazer. No entanto, o verdadeiro progresso vem junto com a liberdade, e talvez seja esse o medo que assola essa pequena parcela da população, mas que ainda detém o poder sobre nossas vidas. E talvez seja também exatamente por isso que a vida atrás das grades (do condomínio) tenha se tornado a solução para estes que continuar a viver no comodismo da não desconstrução.