Foto: “A Governanta”: Pintura de Richard Redgrave, do site RCeliaMendonça
Estava dando aula de inglês para um aluno de 13 anos e surgiu em um texto a palavra “governess”, que ele não conhecia, e significa “governanta”. Mas ele também não conhecia a palavra em português e compreendeu “governanta” como masculino de “governante”, ou seja, uma mulher que governa um estado, país, etc. Então eu expliquei que o raciocínio dele fazia muito sentido, mas que na verdade “governanta” era uma funcionária que gerenciava uma casa e os demais empregados domésticos. Se uma casa muito grande tivesse, por exemplo, quatro funcionários(as) faria sentido ter alguém para gerenciá-los. Mas ele, que é um menino de classe média (alta), nunca havia estado em uma casa com quatro funcionários.
Dessa aula eu extraí duas lições muito interessantes sobre como a sociedade está mudando e a percepção da geração dos anos 2000 sobre algumas coisas.
A primeira lição foi que não faz mesmo nenhum sentido essa desigualdade toda de tantos não terem nem onde morar e outros terem uma casa tão grande que demande ter alguém para gerenciar os vários empregados domésticos. Salvo embaixadas, palácios, castelos e outros lugares cheios de protocolos (apesar de eu questionar esse excesso de protocolos), uma pessoa adulta saudável pode muito bem cuidar de sua casa, sua comida, suas roupas. As pessoas que estavam fadadas ao serviço doméstico, hoje vêm conquistando novos espaços, fazendo faculdade, trilhando carreiras que até há poucos anos eram exclusividade da “casa grande”. Na época da minha avó era bem possível uma família de classe média ter dois ou três empregados domésticos. Hoje, com a legislação trabalhista um pouco melhor e direitos mínimos previstos em lei, já não é mais possível, ainda bem! Porque se a classe média não tem condições de assinar carteira, pagar transporte, férias, etc, então não tem condições de contratar ninguém! Então pode varrer a própria casa, não mata não.
A segunda lição é que se o governantE governa o país, porque a governantA está restrita a governar a casa? É muito importante que tenhamos elegido a primeira presidentA e, a despeito das críticas infundadas e preconceituosas ao termo, essa palavra ajudou as pessoas a perceber com maior naturalidade a possibilidade da mulher na política. Em dias de impeachment/golpe contra a primeira presidentA eleita do Brasil, cabe ressaltar a contribuição que ela trouxe para o espaço feminino na vida pública.
Agradeço ao meu aluno, que me fez aprender bastante com a aula de hoje.
Luíza Fagundes é Bacharela em Relações Econômicas Internacionais pela UFMG, Mestranda em Relações Internacionais pela PUC-Minas e Professora Particular de Inglês.