Foto: Tudo sobre Bichos (Créditos)

PEC da Desigualdade, PEC da Maldade, PEC da Morte e PEC do Fim do Mundo. Todos esses adjetivos descrevem muito bem o que é essa proposta de Emenda Constitucional, que altera os artigos 101 a 105 do ADCT da Constituição Federal de 1988. Sugiro muito ler a íntegra do texto, sem maiores pretensões, com a cabeça aberta, esquecendo-se um pouco do que foi lido pelos diversos analistas, jornalistas, economistas, juristas (da Globo).

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Esse Power Point é muito mais realista. Foto: O Cafezinho

 

Não tem como escapar. É, de fato, muita maldade. Vai aumentar imensamente a desigualdade econômica e social desse país. Vai sim muita gente morrer por não conseguir comprar o que comer, por não conseguir atendimento de saúde, muito menos pagar planos privados. Vai muita gente ter seus sonhos de acesso a uma educação melhor e de ingressar na universidade interrompidos.

É uma irresponsabilidade com a população do país. Tem a desculpa de proporcionar saldo positivo às contas públicas, mexendo com, justamente, o que não poderia sequer ser cogitado: a valorização real do salário mínimo, os investimentos em áreas cruciais para o desenvolvimento econômico do país – educação e saúde -, por um período extremamente longo – 20 anos -, com o único fim de agradar os banqueiros, já que a única coisa que o governo pretende com isso é pagar os juros da dívida pública.

 

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Mafalda explica! Grande parte do nosso PIB é canalizado justamente para o pagamento dos juros da dívida, o que enriquece os banqueiros. Olha como a porcentagem dos gastos em relação ao PIB das áreas de saúde e educação são bem pequenas, comparando-se com a do juros da dívida pública, das transferências para estados e Municípios, por exemplo.

Em um Estado responsável, num governo democrático, no qual o seu plano de governo foi votado pela população, acho que dificilmente essa PEC passaria, ou nem mesmo seria cogitada. Mas num governo ilegítimo, usurpador, que assumiu a cadeira por meio de um golpe, quem se importa com população, com os mais pobres? Esse tipo de governo não tem compromisso com ninguém, só com quem ajudou a colocá-lo lá, de forma não democrática.

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Depois do banquete servido pela Maria Antonieta de calças, pago com $ público, foi facinho passar a PEC em 1° turno. 366 deputados super comprometidos com o governo golpista e descomprometidos com a vida da população brasileira. O vinho, o salmão e o risoto valeram à pena! Foto: Pragmatismo Político.

 

Como funciona essa PEC

A PEC instaura o tal “Novo Regime Fiscal”, que passa a valer por 20 exercícios financeiros. Se cada exercício financeiro (materializado na Lei Orçamentária Anual – LOA) tem a duração de 1 ano, coincidente com ano civil, valerá então por 20 anos! É um período muitíssimo longo para qualquer contenção de despesas, principalmente aquelas em áreas ESSENCIAIS do Estado. E essa emenda só poderá ser revista após os primeiros 10 anos, período este que continua sendo longo.

Eu me pergunto, se é para que o Estado volte a ter sua conta positiva para “voltar a crescer”, “investir mais”, “bláblá”, eles vão investir mais em quê, se a Emenda limita muito os investimentos?

Os investimentos do governo ficarão limitados porque eles terão como base somente o que foi feito no exercício anterior, corrigidos apenas pelo IPCA, que é um dos índices que determina as metas de inflação do país. Não leva em consideração, por exemplo, o crescimento do PIB, o aumento da capacidade do país, as necessidades reais em cada área.

Por que os investimentos na saúde e na educação serão os mais afetados?

Para o contingenciamento, a PEC cita diretamente os artigos que correspondem a exatamente essas áreas, que são, respectivamente, os arts. 198 e 212 da CF/88. Observe:

“Art. 104. A partir do exercício financeiro de 2017, as aplicações mínimas de recursos a que se referem o inciso I do § 2º e o § 3º do art. 198 e o caput do art. 212, ambos da Constituição, corresponderão, em cada exercício financeiro, às aplicações mínimas referentes ao exercício anterior corrigidas na forma estabelecida pelo inciso II do § 3º e do § 5º do art. 102 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.” (NR) (Grifo meu). 

E esses são os investimentos obrigatórios do Estado, que inclusive possuíam mínimos previstos na Constituição. Em relação à educação, para a União, há um mínimo de investimento que é de 18% das receitas de impostos e para os estados e Municípios, 25%. Para a Saúde, no âmbito da União, os recursos mínimos para investimento são de 15% da Receita Corrente Líquida do exercício financeiro vigente.

Não mais.

Penalidades para a Administração Pública

As penalidades para os órgãos ou entidades que descumprirem as limitações atingem diretamente o serviço público e seus servidores e suas servidoras. Vale lembrar que os 3 Poderes, toda a Administração Pública Federal, Direta e Indireta, deverão observar o tal Novo Regime Fiscal. Entre as medidas estão a vedação de aumento salarial, a proibição de criação de cargos, empregos ou funções públicas, a alteração na estrutura das carreiras e a realização de concursos públicos. E, acredite, a maioria dos meus colegas que estava estudando para concursos são a favor de medidas neoliberais ao extremo como essa… Vai entender.

E o salário mínimo?

Outra coisa que a PEC discorre é sobre o arrocho salarial. O aumento do salário mínimo com base apenas na inflação anterior, acabando assim com o seu ganho real, é uma das penalidades caso o Executivo ultrapasse o limite dos gastos.

Em um país em que a grande maioria da população celetista recebe salário-mínimo ou bem próximo dele, a grande maioria dos aposentados e aposentadas também recebe o valor mínimo em seus benefícios, e todos que fazem parte da gama de assalariados, inclusive os profissionais liberais de classe média/alta também têm seus salários de alguma forma afetados pelo valor do mínimo, não há como escapar: todos serão afetados em maior ou menor grau com a desvalorização real do salário-mínimo.

Essa valorização real é uma das melhores medidas de melhorar a distribuição de renda no país para atenuar a enorme desigualdade social presente em nossa sociedade desde sempre, e também movimenta a economia, ao possibilitar o aumento da demanda e do consumo pela população.

Essa parte do salário mínimo não está no texto original, mas foi apresentada por um deputado do PMBD num texto substitutivo. 

Como que fica?

Com o sucateamento da educação primária e secundária, pouquíssimos terão acesso à educação de pública de qualidade (a tão sonhada). Ficaremos à mercê da estrutura social tão injusta e desigual, que cerceia sonhos de melhoria educacional e desenvolvimento profissional, principalmente das camadas menos favorecidas. E como disse o deputado, quem tiver dinheiro (qual dinheiro?) então que pague a escola e a faculdade. Ele vai pagar pro filho dele, uai.

Com o sucateamento do SUS, que é tão admirado no mundo todo, e a impossibilidade de aquisição de planos de saúde privados, que não são nem de longe bons, muitas pessoas vão sim morrer sem possibilidade de atendimento e tratamento.

Fora que, para uma sociedade se desenvolver, é essencial o acesso por TODOS à educação, e a educação de base, tão negligenciada no Brasil é fundamental para a formação social, intelectual e profissional, e à saúde, principalmente a PREVENTIVA, a qual é objetivo primordial do SUS.

Também não podemos nos esquecer de que a população brasileira está envelhecendo, e consequentemente clama por maiores investimentos na área de saúde na manutenção dos benefícios previdenciários. Porém, essa parcela da população sofrerá, pois esse governo tomará o caminho contrário  do necessário a essas pessoas.

E com o salário arrochado? Não dá pra pagar a escola que o deputado paga para seu filhinho, não dá pra pagar os planos de saúde péssimos das empresas e cooperativas privadas, e não dá também para se ter uma vida digna, simplesmente não vai dar.

Eu lamento por mim, por nós, por todos (mas continuo a lutar)

Nosso futuro é um enorme salto para trás. Serão 20 anos de desinvestimentos e de sucateamentos, mas um milhão de anos de retrocesso econômico e social.

Experimentamos melhorias, muita gente pôde ver o outro lado da moeda, muitos puderam ascender socialmente e finalmente quebrar essa estrutura social tão classista, elitista e excludente. Não era pra NINGUÉM ficar calado, aceitar passivamente algo que vai nos prejudicar imensamente e diretamente.

Acabamos de passar por uma ruptura democrática, com o apoio daqueles que realmente acreditavam que os grandes empresários e os banqueiros estavam pagando o pato.

O pato deve ser ver o dinheirinho que poderia ir para o pagamento de juros de dívida indo para educação e saúde pra “gentalha”. É ficar pagando previdência e cumprindo direitos trabalhistas para o proletariado. É competir com a filha da empregada no vestibular, ver o porteiro chegar de carro pra trabalhar e encontrar com pobres nos aeroportos. Eu acho que esse preconceito de classe, que também é racial, tem muito a ver com o que está acontecendo. Eu não escutei panelas quando a PEC 241 foi aprovada em primeiro turno na Câmara.

E as enormes sonegações de impostos que marcam há anos nossa economia? Cadê a Lei Complementar da taxação das grandes fortunas? Isso não traria bilhões aos cofres públicos de forma justa, sem comprometer a vida das pessoas num cenário de aumento de dívida e baixa arrecadação?

Porém, esse país é colonial, é dos produtores de cana de açúcar, é dos barões do café. Isso aí não é nem cogitado, nem passaria. O jeito mesmo é mexer com a plebe, com quem não entende nada, devido à alta manipulação à qual estão submetidos, ou com os “baba-ovo” de elite, que acham que são uns deles e que são igualmente manipulados e alienados (ou a classe média realmente acha que está fora dessa?).

Não precisarei chegar aos 45 anos para ver todo estrago que essa medida trará. Conseguimos vê-los agora e não podemos deixar que isso passe. Definitivamente, não.