Foto: Lápis de Noiva (Créditos)
Hoje vou retomar aquela série de textos sobre consumo consciente e preservação ambiental!
Infelizmente, a resposta para a minha pergunta é: não! A escolha mais consciente e sustentável é, simplesmente, não fazer festa. Quando resolvermos fazer uma festa para muitas pessoas, sempre haverá compras em grande quantidade, desperdícios, plásticos de uso único, utensílios supérfluos, doces e lembrancinhas em embalagens. Claro que podemos mitigar alguns impactos, porém, principalmente quando contratamos empresas grandes e pacotes fechados, muita coisa fica fora do nosso alcance.
Nós recebemos apenas comentários positivos sobre a nossa festa, mesmo que, internamente, eu tenha encontrado várias falhas e tenha percebido que diversos pedidos meus, previamente combinados, não foram atendidos. Então, eu relevei tudo, tentei não me cobrar demais e fechei esse ciclo – foram mais de dois anos de planejamento, alguns estresses, mas, no fim, um sonho também realizado.
Como contraponto, darei o exemplo de uma mini celebração que organizamos para o casamento na Igreja, que ocorreu em data distinta da festa. Eu estive à frente da organização e havia somente 8 convidados – um cenário bem diferente, no qual eu tive mais controle, mas também precisei me dedicar mais.
A festa
Nós contratamos uma casa de festas tradicional no Rio de Janeiro. O pacote incluía salão de festas, buffet, doces e bolo, mesa de drinks, decoração e DJ com som e iluminação. Para tudo isso, o preço foi bastante acessível e, em apenas um contrato, já tínhamos a festa praticamente pronta, o que facilitou bastante o nosso planejamento.
Eu sabia que, em pacotes fechados como esse, nosso poder de escolha ficaria reduzido. Porém eu estava obstinada em tentar, de todas as formas, deixar a festa mais “sustentável”. Com certeza, eu fui uma das clientes mais chatas com a qual a empresa teve que lidar (rsrs).
O Buffet
O buffet sempre foi um ponto muito sensível para mim. A meu ver, uma festa verdadeiramente sustentável deveria, no mínimo, ter um buffet vegano e, no máximo, vegetariano. Meu companheiro não é nem um nem outro e solicitou que encontrássemos um ponto de equilíbrio. As discussões se iniciaram muito antes de fecharmos qualquer contrato. Havia momentos em que eu desistia de tudo, em outros eu estava mais flexível. Eu deveria considerar também os/as convidados/as, por mais que eu pensasse: ficar uma noite sem comer carne não poderia fazer mal a ninguém…
Meu companheiro passou a consumir cada vez menos carne vermelha, de porco e mesmo de frango. Decidimos, então, que o buffet seria “peixetariano”. Por mais que eu ainda ficasse aflita com os impactos da pesca e da criação de peixes para consumo humano, eu também ponderei que a indústria de laticínios e de ovos causa muitos danos ao meio ambiente e aos animais, e um buffet vegetariano não estaria livre de tudo isso.
Outro problema é que nós não sabemos a procedência dos alimentos, se são da agricultura familiar ou da pesca artesanal, por exemplo. Não pudemos optar por alimentos orgânicos e livres de agrotóxicos, nem por ovos de galinhas criadas soltas. Em suma, tivemos muito pouco controle sobre o que foi servido em nossa festa.
Dicas: Em uma das degustações que fizemos, percebi que alguns petiscos eram servidos com palitinhos de acrílico. Logo conversei com o chef e pedi para que os substituíssem por palitinhos de bambu. Também não escolhemos petiscos que pudessem vir em copinhos de acrílico. Quando possível, perguntávamos se poderia haver a substituição por copinhos de vidro.
Eu gostaria que alguns doces fossem veganos, mas como fechamos o tal do pacote completo, teríamos que ter mais gastos extras, o que estava fora de cogitação. Os bem-casados também estavam no pacote e não haveria outra saída: eles deveriam ser embrulhados em plástico, por conta do doce de leite.
Dicas: Acho aquelas forminhas de docinhos bem desnecessárias e bregas (rsrs). Decidimos não as comprar, e expliquei ao cerimonial que não haveria problema em colocar os docinhos diretamente na bandeja – acho até mais bonito. Não houve bolo fake gigante, que é feito de isopor com pasta americana e, separadamente, o bolo de corte, servido já nos pratos pelo buffet. Conseguimos optar pelo Naked Cake, que não leva pasta americana, brilhos e outros paranauês. Foi o bolo mais lindo e mais gostoso que já vi e comi na minha vida! Ele era o único bolo da festa e temos um grande estoque ainda congelado.

Os problemas com o buffet
Pensamos minuciosamente no nosso cardápio, para que este fosse agradável e atendesse a noiva, o noivo e os/as convidados/as de forma satisfatória. A ideia era que as pessoas nem mesmo sentissem falta da carne. Conseguimos oferecer uma mesa árabe vegetariana e havia também uma mesa de crepes com opções vegetarianas e pasta de camarão. Tivemos reunião com o chef e parecia estar tudo acordado.
Eis que vejo, durante a festa, vários salgadinhos com carne rondando nas bandejas. Cheguei a duvidar do meu discernimento após vários drinks, mas as pessoas me confirmaram posteriormente. No início, o buffet estava bem nos conformes. Do meio da festa em diante, começaram a oferecer bolinhos de feijoada, bolinho de aipim com carne seca, frango empanado… Parecia piada! Amigos/as mais próximos/as até se surpreenderam com essa minha suposta “flexibilidade” rsrs.
As pessoas elogiaram tanto o buffet que eu acabei deixando para lá. Porém, internamente eu fiquei bastante chateada e cá estou desabafando neste texto. Não sei o que mais poderia ter sido feito, pois eu e meu companheiro fomos muito incisivos/as em relação ao buffet. Na hora da festa, não temos tempo para pensar tanto.
Em relação aos docinhos, as cerimonialistas me interromperam três vezes, enquanto eu estava me arrumando, para falar que seria impossível servi-los diretamente nas bandejas, que ficaria feio, anti-higiênico e que iria contra os padrões da casa. Não entendi muito bem, pois, quando falamos sobre isso na reunião, parecia que havíamos chegado a um consenso. Elas me convenceram pelo cansaço. Deixei bem claro que não iriamos pagar pelas forminhas e elas afirmaram que seria uma cortesia. E lá estavam os docinhos naquelas forminhas plásticas super bregas!
A decoração
A decoração era outro ponto muito sensível para mim. Assim como a indústria da carne, do leite e dos ovos, a indústria das flores naturais é bem cruel. Para a sua produção, são utilizadas enormes quantidades de agrotóxicos e de água potável; os salários pagos às/aos trabalhadoras/as são extremamente baixos; a depender da espécie, muitas são cultivadas fora de época, em ciclos antinaturais; e a maioria vem de longe, de países pobres – some-se a todos esses problemas aqueles advindos de processos de importação e exportação.
Por eu gostar de um estilo mais rústico, eu achava que imensos vasos de flores naturais nada tinham a ver com a nossa festa. Sempre pensei em utilizar flores e folhas secas e algumas plantas naturais plantadas em vasos, como os buchinhos, além de enfeites reutilizáveis como macramês, cordas, vasos em cerâmica…

Dica: na saída do noivo e da noiva, compramos (mas daria para catar na natureza também) folhas secas para que jogassem em nós. Havia lido que há casais que optam por soltar balões de gás hélio e já fui a casamentos em que acenderam aquelas velas faíscas. São duas opções pouco sustentáveis.
A nossa casa de festas foi vendida para um grupo maior na pandemia. A decoradora anterior, com a qual eu já mantinha um contato e parecia mais aberta, fora demitida. O novo decorador não escondia a paixão que mantinha por flores naturais. Era seu estilo, sua marca. Eu sabia que não seria fácil.
Dicas: A decoração é uma parte muito complicada da festa. Contratar um/a decorador/a independente e tradicional sai muito caro e, em geral, nenhum/a vai querer mudar o estilo, pois é a marca registrada deles/as. Por outro lado, quem faz decoração mais rústica, minimalista e com menos flores naturais costuma oferecer um bom preço. Contudo, em pacotes fechados como o nosso, tivemos essa limitação.
Em nossas reuniões, eu mostrei diversas fotos de decorações com folhas e flores secas, com pegada mais minimalista. Ele afirmou que faria o possível, mas que ter uma ou outra flor natural ficaria harmonioso, bonito e chique. Eu acabei entregando às deusas.
Os problemas com a decoração
Eram os problemas mais previsíveis. Quando cheguei para me arrumar, por volta de 8:30, o pessoal estava retirando a decoração da festa de 15 anos que aconteceu na noite anterior. Vi vários arranjos de flores rosas e roxas deixados de lado e senti pena por tudo aquilo ir para o lixo. A nossa decoração era para ter sido nas cores rosa chá e bege, com as tais das flores e folhas secas, leques, painas…
Eis que, quando vejo a decoração da nossa festa pronta, lá estavam as flores naturais super rosas e roxas, que haviam sido utilizadas, previamente, na festinha de 15 anos. Não encontrei os leques, nem folhas de eucalipto, e vi poucas painas. Porém, gostei de uma coisa: as flores naturais puderam ser reutilizadas. E tentei ignorar o resto, para não me entristecer demais.
Mesa de drinks
Da mesa de drinks, não tenho o que reclamar. Foi tudo ótimo. As bebidas foram servidas em copos de vidro ou de acrílico. Os canudos foram de papel, pois, no Rio, canudos de plástico são proibidos por lei. Porém, essa não é a realidade da maioria dos municípios brasileiros.
Dicas: Não custa muito substituir canudos de plástico pelos de papel. É bom também orientar o pessoal do bar a não sair colocando os canudos na bebida – é melhor deixar que a pessoa faça essa escolha, além de ser uma prática mais higiênica.
Pelo que ando escutando por aí, parece que alguns serviços de drinks passaram a servir as bebidas em copos plásticos. Acredito que seja para economizar na compra de diversos copos de vidros e para evitar as perdas que podem ser causadas por eventuais quebras. Além de ser o ó do borogodó beber drink em copo plástico, a economia que isso poderia trazer não compensa. Converse antes com a empresa. Se servirem drinks somente em copo plástico, escolha outra, pelo amor das deusas!
Chinelos e lembrancinhas
Chinelos de borracha são inimigos da Natureza. Por mais que algumas mulheres os utilizem depois – eu sou uma delas -, muitos vão parar nos aterros, nos mares e nos oceanos. Inicialmente, a minha ideia era fazer uma festa mais simples e rústica, para a qual as mulheres poderiam ir de rasteirinha ou de saltinhos baixos, e eu evitaria ter que oferecer chinelos.

Como a festa foi ficando mais clássica, ainda que contra a nossa vontade, tentei pensar em alguma solução. Minha ideia inicial era comprar rasteirinhas feitas 100% de palha, mas elas eram muito caras. Acabei encontrando um meio termo: uma que era revestida de palha, com as tiras de plástico. Mas elas não eram chinelos, eram rasteirinhas fofas, que teriam mais chances de serem utilizadas depois da festa.
Para lembrancinhas, escolhemos oferecer suculentas plantadas em potinhos plásticos, revestidas com dizerem em papelão. Não quisemos nada além disso, nada em potinhos de acrílico ou coisas embrulhadas em mais plásticos…
Convite
Nossos convites foram 100% sustentáveis, pois foram 100% online. Sei que pode parecer ofensivo não enviar convites físicos, principalmente para familiares e pessoas mais tradicionais. Porém, sabemos que 100% desses convites vão para o lixo em questão de dias. Atualmente, tudo é feito em rede social, e com convites não precisaria ser diferente. Em vez de fazermos aqueles convitinhos individuais, pedimos para que as pessoas confirmassem a presença diretamente no nosso site.
Eu cheguei a pensar em fazer convites mais sustentáveis, com tintas não poluentes e em papel biodegradável, mas daria tanto trabalho e geraria mais um custo desnecessário, que achamos melhor deixar tudo no site e no “zap” mesmo.
Os convites para madrinhas e padrinhos foram simples e artesanais. Para as madrinhas, compramos caixinhas de MDF. Forramos com palha natural e colocamos 1 esmalte vegano e 1 sabonete natural e vegano. Para os homens, compramos uma sacola térmica e colocamos 1 garrafa de cerveja artesanal de Petrópolis.
O que não foi nada sustentável: eu quis padronizar as roupas das madrinhas e dos padrinhos. Muitas tiveram que comprar vestidos novos da cor estabelecida, e muitos tiveram que comprar calças novas. Também demos um corsage para as madrinhas, que não terá outro uso; e, para os padrinhos, demos um conjunto de gravata borboleta e suspensório, que também não será reutilizado.
Vestido, maquiagem, buquê, terno, sapatos
A indústria da moda também é outro terror para a Natureza. Mandar fazer um vestido do zero, no nosso estilo, com a nossa cara, pode ser legal. Porém, o que vamos fazer com ele depois?
É sempre melhor alugarmos um vestido que já existe e que poderá ser usado várias vezes, por várias noivas. Ou, se fizermos questão de algo exclusivo, que seja no estilo “primeiro aluguel”. Eu cumpri parcialmente esse mantra. Para a festa, alugamos o vestido, mas, para a Igreja, eu acabei mandando fazer um mais simples. Ele é tão bonito que gostaria de guardá-lo para sempre, mas é claro que estou pensando em vendê-lo em sites de compras de segunda mão!
O meu companheiro fez o certo: alugou o terno. A cor era um azul claro, bem cara de noivo. Ele realmente não iria usá-lo em outras ocasiões.
Nossos sapatos foram veganos. É mais fácil encontrar sandálias de noiva feitas com materiais sintéticos, mas sapatos de homem geralmente são feitos em couro de boi ou de ovelha. Na internet, há várias lojas que vendem sapatos sociais masculinos veganos!
A maquiagem foi outro ponto que me tirou o sono. Eu sabia que seria impossível fazer uma maquiagem de noiva com produtos 100% naturais, veganos ou que ao menos não testavam em animais. As profissionais prezam pela qualidade, e muito do que se pensa como “qualidade” está em utilizar somente produtos importados, de marcas chiques europeias ou estadunidenses, mas que não são nada compromissadas com o bem-estar animal.
De fato, as maquiagens naturais não têm a durabilidade exigida para uma festa de casamento. Contudo, há maquiagens não-naturais veganas brasileiras que possuem uma qualidade sublime, que concorre com aquelas chiques, como a QDB e O ‘Boticário.
Escutei conselhos como, é somente um dia, não se culpe; no dia a dia você não usa esses produtos, então não tem problema; é melhor não arriscar e deixar a profissional fazer o trabalho com os produtos com os quais ela já está acostumada. E assim foi. A maquiagem ficou linda, durou a festa toda e eu tentei sublimar todas aquelas questões. Porém, acredito que, se eu procurasse melhor, eu encontraria alguma profissional que utilizasse produtos veganos ou que não testam em animais.
Por fim, com o buquê, eu consegui encomendar um que tivesse algumas rosas e o restante em folhas e flores secas e capim dos pampas. Hoje, ele virou um enfeite no nosso quarto. Um buquê tradicional vai parar no lixo em questão de dias.

A comemoração pós-Igreja
Resolvemos fazer uma comemoração pós-casamento na Igreja Católica, que possuiu um grande valor para a gente. Por ter sido no estado natal do meu companheiro, eu conhecia pouca coisa e acabei gastando muito tempo para pesquisar fornecedores. Por outro lado, tive a total liberdade para fazer algo mais do meu jeito, com menos impactos ambientais e com preços mais acessíveis.
A decoração foi 100% sustentável. O decorador utilizou somente as tais folhas e flores secas. A única folhagem natural eram folhas de salgueiro, que ele catava na estrada. Ficou perfeita.

Compramos salgadinhos, tortas, docinhos e bolos 100% veganos. Se agradou a todo mundo, infelizmente, acho que não. Acredito que teremos que percorrer um longo caminho para nos tornarmos menos dependentes de produtos de origem animal. A nossa memória afetiva sempre nos remete a comidas que comíamos desde a infância, repletas de animais e de seus derivados.
É um processo para quem coloca a ética antes do prazer, o que é, sim, muito difícil.
Uma conclusão a que cheguei foi a de que, talvez, fazer uma festa menor, em um local mais rústico, menos pomposo, e com contratos independentes facilitaria nosso controle sobre os fornecedores e obteríamos mais poder de escolha. A ideia de “mini-wedding” parece agradar a casais que pretendem não gastar tanto e que querem estar mais à frente da organização.
Contudo, em um relacionamento, vontades, desejos e sonhos devem encontrar um equilíbrio. Meu companheiro realizou um sonho e o sonho dele acabou se tornando o meu também. Para a nossa festa, fizemos o possível. Não o suficiente, mas o que esteve ao nosso alcance.